domingo, 24 de maio de 2009

Circularizando....

Pessoal, desta vez, voltei belíssimo e pra ficar REALMENTE.... não decepcioná-los ei!

De presente, o conto de um homem que perde seu grande amor e fica piradinho, não distinguindo se está são ou não....e o leitor entra na paranóia dele... ler para crer como acaba esse impasse....


CIRCULAR



São quase cinco... ou quase isso. Ou talvez já tenha passado. Não sei. Não lembro. Aliás, não me lembrarei de nada até quando estiver bem acordado ou até que alguém venha me acordar e me contar do inferno de cada dia. Inferno de TODO dia. Todo o dia.
Contar o quanto fiz e bebi a noite passada (ou terá sido a outra?). Não lembro. Eu tento, eu juro que tento levantar! Olhei pra cômoda e a garrafa de vodka (urgh!) ainda estava lá, mas tava pela metade... não é possível dormir só com meia garrafa. Juro que fiz força, mas demorei algumas horas (na verdade, minutos intermináveis que a cabeça não registrava por burrice, ou bebidice mesmo), pra me levantar. Ave! Que ressaca! Que solidão! Estranho como farreamos felizes e acordamos... a sós. Na verdade, algumas farras com amigos ou amantes são mais solitários.
Mas levantei. Direita? Esquerda? Pra onde seguir? Puta, que sede! Vou beber essa água... opa... é a vodka. A água fica onde mesmo? Ai, caramba, a cabeça ainda dói!
Corredor. Minha nossa! ... que bagunça! Um maço de cigarros. Peraí! Mas eu não fumo! Mas isso é hoje. Talvez ontem eu tivesse fumado! Um sapato de mulher embaixo da cômoda que estava com o maço em cima. Por Deus! Eu nunca usei um sapato de mulher! Nem é meu, seu estúpido! ...deve ser daquela menina de ontem... ou terá sido a de anteontem? Não consigo lembrar... todas são iguais... os dias são tão iguais... as noites também. Ontem fez um ano que minha garota se foi. Garota durona, linda, do tipo 1,70, morena, corpuda, uns olhos!, uma boca!, uma... bom, isso só interessa a mim. Ou interessava. Ah ta! Quem sabe da bebedeira tenha sido isso? Comemoração de um ano de fossa! Mas tenho a leva impressão de que eu comemorei isso na semana passada... ou talvez eu tenha comemorado o fato de faltar uma semana pra completar um ano... Acho que comemoração era a palavra certa antes da bebedeira. Depois sempre vinha decepção, melancolia e uma dor de cotovelo desgraçada ao lembrar que ela tava bem e com meu ex-melhor amigo. Mas isso foi há sete meses... Será que estou enlouquecendo? Não consigo colocar as idéias em ordem! O tempo, as histórias, estão se entrelaçando de forma forte demais... tá dando um nó incrível nessa cabeça afundada em álcool.
Cheguei no banheiro. Tinha um batom lá. Terá sido da mesma menina do sapato? E desde quando eu saio com meninas que fumam? (Desde que ela começou a fumar, babaca!). Duas escovas de dente? (De repente, ela pode voltar!). Depois que eu mijei, dei descarga, mas o som saiu tão diferente! Sei lá... será que alguém entupiu essa droga? Fui pra sala. Cara! Tinha outros três ex-amigos meus lá! Tinha mais quatro meninas lá (qual delas devia ter sido), e uns quadros que eu não me lembrava de ter comprado... talvez eu mesmo tivesse pintado, mas essas habilidades eu reprimi há doze meses.
Trezentos e sessenta e tantos dias... ou terá sido a semana passada? O que aquelas pessoas estavam fazendo ali? Senhor! Será que isso é um sonho? Algo entre Almodóvar, Picasso e Cortazar. Mas preciso comer algo. Não tava com fome, mas ás vezes é bom. Aquela cozinha definitivamente não era minha. As facas nunca ficam do lado esquerdo da gaveta. Talvez eu tivesse mudado há quinze dias... eu sempre quis mudar! Ou a diarista botou no lugar (deve ter achado esquisito encontrar facas no banheiro). Abro a geladeira. Tava mais frio fora. Tinha um pedaço de bolo (aniversário? Meu? De um ano de partida? Ou de uma semana para um ano? Quem sabe o aniversário de um ano seja semana que vem? Ou talvez, ainda, o aniversário de um ano tenha sido há um ano? Como lembrar? Como esquecer...
Acabei sentando à mesa com um copo de café na mão. Tava muito frio, o que me fez pensar que o fiz há três milhões de anos. Espera aí... mas existia café há três milhões de anos? Gota em gota... a água pingava da torneira. O encanador não veio aqui mês passado? Talvez eu tenha quebrado de novo... um despertador começou a berrar. Tinha, como todos os dias, acordado antes dele. Eu me deito e ele é a única coisa que funciona. Durmo. Sonho pouco... acordo e fico olhando dolorosamente prá ele. Mais uma noite se passou e a cabeça fica o dia todo pesando. Quando eu não tô em casa, não lembro dele. Mas, ao voltar, de madrugada, vejo quanta falta ele fez... meu único companheiro. Os ponteiros se mexem e todos se vão... e tudo se vai... e o tempo permanece... me torturando. Lembrei que precisava trabalhar. Como é que essas pessoas foram parar aqui?
Rua. Padaria. Café de novo. Quente agora! Pedestres, ruas, o semáforo verde... amarelo... vermelho... verde...faixas... pessoas, cheiros, postes. Um ônibus (eu devia ir num desses), mais gente. Gozado... parece que eu os conheço, mas ninguém me olha... um outdoor imenso com um coração estampado... deve ser comercial de calcinhas ou perfume, ou sei lá o que porque eu só reparei no coração... empresa, segurança, elevador... agora com três consoantes: CHeFe! Isso, eu sabia que conseguiria! Cabeça na lua, agora sol, depois estrelas e idéias vagas depois de não conseguir dormir, nem sonhar. Bronca, almoço, sobremesa sobre a mesa... torta de alguma coisa... nada desceu, só parei no terceiro andar. Aproveitei que ninguém entrou. Foram quatorze andares só... e só comecei a chorar no terceiro andar. Cinco horas... esse horário é perseguidor e implacável. Saí. Quase trombei com a mocinha bonitinha que sempre me olha e eu nunca a enxergo direito. Hoje não foi diferente. Quase um carro me atropelou, ou eu quase me joguei... um senhor que eu encontro todos os dias me disse as primeiras palavras de nossa muda e recíproca amizade entre desconhecidos.: - Você está bem? Não respondo e ele entende. Na padaria da esquina tinha uma prateleira elegante. O rapazinho de lá me cumprimenta muito sorridente... talvez eu venha aqui com certa freqüência. Comprei uma garrafa de vodka. Tava sem grana mas... SURPRESA!, já tinha conta lá.
Prédio, porteiro, escada. Elevador, seis andares só... subindo. Chego. O som ligado. Tinha demorado na rua. Porta fechada... sem tranca. O porteiro tinha me falado alguma coisa... sei lá. Respondi: - Hum hum... Obrigado, boa noite pra você também e entrei no elevador, agora, em casa. Ela estava vazia (esqueci de novo o rádio ligado?). sem ex-melhores amigos... sem quatro garotas. O cigarro continuava lá e o batom também. O sapato, não. Tinha um monte de louças para lavar. Mas a diarista não veio ontem? Ou será amanhã que ela virá? Talvez o pessoal chegaria mais tarde. Tinha combinado na festa de três dias (ou terá sido quatro ou cinco?) dias atrás. Ou talvez eu tenha que ir buscá-los naquele bar... ou na outra boate. Com quantas ainda? Quantas mais? Quantas noites? Mais? Outro gole. Quantas iriam me fazer pagar? Já não foi tão caro só a partida? Partida de futebol! Amanhã á tarde! Peraí... parei com o futebol quando comecei a vodkal.
O engraçado é isso! Tudo muda mas é tão igual! Os lugares que vou... me parecem estranhos, mas é onde sempre fui. Se algo mudou foi em algum ponto de mim que não consegui entender. Ao menos eu lembrei que tinha que trabalhar. Há sete meses e três empregos eu sabia... ou não lembrava. Tô melhorando. Hoje lembrei que não fumava. O cigarro não podia ser meu. E talvez nem essa casa. Duas escovas de dente? Um batom e sapato? Será que sou um traveco? Acho que não porque o número não era o meu. Era menor como meu coração piegas.
Eu soltava pipas. Não tem nada a ver, mas me lembrei disso agora e gostava sabe... ninguém ligou.
Ninguém ligou... acho que já cortaram a linha ou eu tirei o fio.
Tudo é igual. Todos os dias... todas as horas... todas as noites e pessoas. Se ela deixou o batom e o cigarro... ela vai voltar. Hoje avancei mais um pouco. Lembrei que ela é quem fumava e usava batom. Amanhã quem sabe eu me lembre do que aquele povo tava fazendo aqui, na minha sala. Mas eu durmo fora de hora, sem hora, nem sei se o povo ficou aqui a noite passada. Não lembro, não consigo me lembrar de nada. Só aos poucos. Melhor assim. Posso fazer algo diferente. Diferente sem eu saber porque apaguei o que eu sabia com o último cigarro que fumei numa madrugada dessas aí... mas eu não fumava! Quem garante? Eu não me lembro... Mas estou progredindo. Quem sabe amanhã? Ou essa música é longa assim ou ta tocando no repeat desde que eu me lembro. Quando? Puxa! Já é amanhã! Preciso ir dormir porque nem consigo enxergar direito. Meia garrafa de vodka misturada com uma vida inteira sem paz para dormir nos últimos trezentos e sessenta e tantos dias... ou terá sido a semana passada? Mas eu não uso sapato de mulher, nem uso batom como um travesti, quando comi a torta de sei lá o que no quinto andar (ou no terceiro que eu vi a mocinha que me olhava?). A garrafa de vodka tinha 1,70m, parecia água de longe e que olhos! O Almodóvar teve uma semana de bebedeira com o Picasso e o Cortazar me despedirá essa manhã. Ou talvez já o tenha feito há trezentos e sessenta e tantos dias... ou será sido a semana passada? Não me lembro do meu ex-melhor amigo ou das facadas na xícara de café gelado, agora quente. A torneira quebrou quando eu fui na padaria comprar o porteiro pra escada da empresa que tem três cores no farol... amarelo... verde... ver... ver... melho! É a cor do batom! O telefone não pega porque eu cortei o vodkal... na partida do bolo que já tava lá desde a semana passada. Ou terá sido há trezentos e sessenta e tantos dias? Lembro que fumei o cigarro na madrugada que a pipa partiu. Desde que você partiu. E tudo, e todos, e todas as pessoas e todas as madrugadas têm sido iguais. E tudo é igual. E eu não lembro de nada. Desde agora. E cada dia eu tento. Hoje descobri que não sou um travesti (eu acho) e fumei um cigarro me afogando na bebedeira de cada noite... estou entorpecido... sou sozinho. Sou e estou. Qual é a diferença? O importante é que eu decidi lembrar e cada dia descubro alguma coisa.
Amanhã, que já é hoje, talvez eu lembre quem eram aqueles e porque estavam ali e o que aconteceu com a outra garrafa de vodka (fui bebendo pro serviço?). Mas o sono (talvez) está chegando. Cochilo. Acordo antes do relógio. De novo. Lembrei disso. De novo. Mas não consigo enxergar. Vou olhar pro tempo até ele berrar no meu ouvido e eu acordar. Ou tentar. O que já é um começo. Será que ela vai voltar?
Fixo meu olhar, pelo que eu me lembre, como todos os dias no desperta a dor. Quase consigo me despertar. Da dor. Ei! Peraí! Acho que consegui!
São cinco... ou quase isso. Ou talvez já tenha passado. Não sei. Não lembro. Aliás, não lembrarei de nada, até quando estiver bem acordado ou até que alguém venha me acordar e me contar do inferno de cada dia. Inferno de TODO dia. Todo o dia.
Contar o quanto fiz e bebi a noite passada. (ou terá sido a outra?)
Não lembro.
Eu tento, juro que tento.

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